Abraçando a causa indígena com a alma

Padre Philip está de partida para o Quênia, após 12 anos de trabalho no Brasil, seis deles entre os Povos Indígenas da Amazônia.

 Por Philip Njoroge Njuma *

Eu sou padre Philip Njoroge Njuma, missionário da Consolata. Nasci no dia 25 de junho de 1975, no Quênia. Fiz meus estudos da escola fundamental, ensino médio e faculdade no meu país natal, antes de ingressar no Instituto Missões Consolata (IMC). Meu primeiro contato com os missionários da Consolata foi no ensino médio, porque já tinham entregue a minha Paróquia Gaichanjiru bem antes de eu nascer para os combonianos, que a passaram para a diocese.

Entrei no seminário no ano de 2003 para fazer os estudos do propedêutico e logo depois, três anos de filosofia. Fiz meu noviciado no Quênia em 2007 e 2008, em Sagana, fazendo minha primeira profissão, ou seja, afirmando no que acredito, no dia 12 de julho de 2008. Após o noviciado, fui destinado para estudar teologia no Brasil, onde cheguei em agosto de 2008. Meu primeiro passo era aprender a língua portuguesa em Cascavel (PR) por três meses, antes de começar os estudos teológicos em 2009, na Escola Dominicana de Teologia. Após a Teologia, fiz o meu ano de serviço na Bahia, na Paróquia de Feira de Santana que se concluiu com a profissão perpétua no dia 11 de maio de 2013, também em Feira de Santana, seguido com minha ordenação diaconal em Salvador (BA) no dia 19 de maio de 2013. Logo após participar na Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro (RJ) com a juventude da Bahia, viajei para o Quênia para preparar a minha ordenação presbiteral. 

Ordenação

No Quênia, fui ordenado no dia 15 de fevereiro de 2014 em Westlands, Casa Regional da Região Quênia-Uganda e destinado para a Região da Amazônia no Brasil. Ao chegar à Amazônia em agosto de 2014, recebi a destinação de trabalhar na missão Maturuca entre os Povos Indígenas Macuxi, Wapichana, Ingaricó, Patamona e Taurepang. O meu primeiro contato e experiência com os Povos Indígenas Tupi Guarani da Grande São Paulo, da Aldeia do Pico do Jaraguá no tempo dos meus estudos teológicos ajudou bastante a me inserir na realidade amazônica.

Os seis anos no meio do povo Macuxi principalmente foram momentos de graça e aprendizagem. Encontrei um povo simples que não precisa muito para ser feliz. Aprendi com eles que, alegria não é um fruto de acúmulo da riqueza, mas, surge do coração. Isso facilitou meu trabalho como coordenador da missão e vice-superior regional na região da Amazônia. Foi um período cansativo manter os dois cargos, mas, muito gratificante.

Sim à Comunidade

Os Povos Indígenas com quem eu trabalhei vivem a vida comunitária com alguns regimentos internos como: “Não à bebida alcoólica e sim à Comunidade”. Eles valorizam união, compromisso e vigilância. Admirei esse povo pela sua simplicidade e acolhida. Eles acompanham a missão com amor e carinho e fazem com que os missionários se sintam à vontade pela amizade e aceitação.

Os desafios são muitos, mesmo que não reclamemos, ao invés, busquemos superá-los. Na nossa Missão, existem 75 comunidades que estão distantes umas das outras e algumas não têm acesso aos carros. Nas quais conseguimos chegar com os carros, as estradas são precárias e cheias de buracos. Devido à presença dos benefícios sociais, o povo fica acomodado sem querer produzir e criar muito, porque é mais fácil e menos cansativo comprar os produtos que cultivar e criar. Especialmente entre os jovens, há dependência com as drogas e bebidas alcoólicas. O abandono do poder público é total no âmbito da educação e saúde. Devido ao contato frequente com a cidade de Boa Vista, capital do estado, as Comunidades vão perdendo a sua língua materna e também devido à história do passado de proibição das línguas maternas nas escolas. Esse frequente contato com a cidade favorece o contágio e proliferação da pandemia nas Comunidades. No âmbito da Igreja, mesmo comemorando 100 anos de evangelização na região das Serras onde trabalho, existe muita dependência das comunidades com a Missão. A maioria das pessoas pensa que a Igreja é do padre e que este deveria providenciar tudo. As Comunidades ainda não assumiram a Igreja na sua totalidade.

Um dos grandes desafios que posso citar é o comodismo devido aos benefícios sociais. Estilo da nossa evangelização que geralmente se solidariza mais nas lutas pelos direitos e pela terra e cobra menos os deveres do povo indígena. Há também falta de missionários com mais experiência, que poderiam acolher e inserir os novos na missão. A maioria dos missionários é nova e poucos são de idade, mas, faltam missionários com mais experiência. Mesmo com tantos desafios, as palavras do escritor William Shakespeare nos anima: “é melhor acender a vela que amaldiçoar a escuridão”.

O nosso trabalho entre os Povos Indígenas é literalmente de presença deixando que sejam protagonistas das suas vidas, evitando paternalismo. Estou me despedindo da Amazônia que tanto amei devido a outros clamores de minha família no Quênia. Regresso para minha terra sem me fechar à possibilidade de um dia voltar para somar forças com os demais missionários da Amazônia. Acredito que seis anos da missão no meio dos Povos Indígenas não são suficientes. Mesmo assim, comungando com suas alegrias e tristezas, valeram a pena e me ensinaram muito. Isso vai me ajudar a me doar ainda mais em qualquer outra Missão a mim confiada na minha terra natal.

Termino dizendo que a Missão é de todos nós. A causa indígena é de todo Instituto. Vamos abraçar essa causa com alma e coração e evitar só ficar nas conversas ou no mundo das ideias. Coloquemos as nossas mãos na massa. John F. Kennedy falou, “Não pergunte o que o seu país pode fazer por você, mas o que você pode fazer pelo seu país”. Eu também afirmo, baseado nesse grande pensador: “Não pergunte o que o Instituto pode fazer para você, mas, o que e como missionário da Consolata, você pode fazer pelo Instituto, colaborando na Missão segundo as suas capacidades e disponibilidades, sem desejo de poder, ganância ou preconceito junto ao povo”.

* Philip Njoroge Njuma, imc, é missionário da Consolata.

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