A Igreja do papa Francisco e a 61ª Assembleia da CNBB

O atual sucessor de São Pedro fustiga uma Igreja clerical, frisando constantemente que o batismo é o sacramento fundamental, que iguala a todos os membros da Igreja.

Por Edson Luiz Sampel

O papa Francisco envida esforços imanes na remodelação da Igreja. Ele não quer criar nada; anseia tão somente tornar a Igreja católica mais próxima da vontade fundacional de Jesus Cristo. Podemos também asseverar que o papa se estriba completamente nos princípios do Concílio Vaticano II e, com isso, também se aproxima do Cristo histórico.

As pessoas casadas em segundas núpcias, que antanho não podiam comungar, agora podem ao menos submeter seu caso concreto ao discernimento pastoral, para eventual recepção do santíssimo sacramento, conforme a exortação apostólica Amoris Laetitia, exarada em 2016. No presente pontificado, os pares homossexuais obtiveram direito líquido e certo a um sacramental, uma bênção, nos termos da declaração Fiducia Supplicans, emanada em dezembro de 2023. As mulheres talvez dentro em breve possam ser ordenadas diaconisas. Mas, o sumo pontífice não está forjando nova doutrina; trata-se de autêntico aprofundamento nos ditames do evangelho. Em nenhum momento, restou vulnerado qualquer dogma.

O papa Francisco, como nenhum outro bispo de Roma, tem combatido vorazmente a praga da pedofilia, expulsando padres e bispos que cometerem este hediondo delito (cânon 1398 do novo Direito Penal Canônico - 2021).

O atual sucessor de São Pedro fustiga uma Igreja clerical, frisando constantemente que o batismo é o sacramento fundamental, que iguala a todos os membros da Igreja. A propósito, no seu último livro, publicado em 1º de abril de 2024, o papa Francisco é enfático: “Devemos olhar para o futuro simplificando as coisas, tentando superar o clericalismo, a atitude de superioridade moral e de distanciamento em relação aos fiéis que se tornou uma doença, um flagelo!” (“Vida, a minha história através da História”, p. 286, in fine).

Neste diapasão, os leigos vêm ocupando postos importantes no governo da Igreja, principalmente na cúria romana, coadjuvando os padres, os quais passam a dispor de mais tempo para as tarefas sacramentais.

Pensando exatamente na nova abordagem do exercício do poder que o papa Francisco tem inculcado, a qual se traduz na corresponsabilidade entre todos os membros da Igreja Católica (os batizados), a Comissão Especial de Direito Canônico da 116ª Subseção da OAB-SP encaminhou um ofício a dom Jaime Spengler, presidente da CNBB, sugerindo uma mudança relevantíssima no recém-promulgado estatuto canônico da conferência episcopal. Deveras, o estatuto não prevê a participação dos leigos na assembleia geral, órgão de governo da CNBB que, entre outros assuntos, delibera acerca de questões pastorais do dia a dia dos fiéis (por exemplo, os tão polêmicos textos das últimas edições da Campanha da Fraternidade). O alvitre da comissão, para eventual exame este mês (abril de 2024), na 61ª Assembleia da CNBB, diz respeito precisamente à emenda do estatuto, com a convocação compulsória de um grupo de leigos, dos regionais da CNBB, para serem ouvidos durante a realização da assembleia.

É simplesmente incompreensível que o evangélico exemplo do papa Francisco, outorgando direito de voto a leigos no Sínodo da Sinodalidade ora em curso, não seja emulado pelo novel ordenamento jurídico da CNBB! Esclareça-se que o Sínodo é evento que originalmente congrega apenas bispos, tal como a CNBB.

Que o clericalismo seja lancetado do coração de clérigos e leigos, em prol da plena igualdade e responsabilidade entre os fiéis, injunção de Jesus e sonho do papa Francisco!

Edson Luiz Sampel é professor do Instituto Superior de Direito Canônico de Londrina.

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