As Parábolas do Reino dos céus

Caetano Ferrari *

Jesus gostava de falar ao povo da Galileia usando parábolas. Ele era um comunicador extraordinário, de colocar no banco de reservas os melhores craques da comunicação de hoje. Em meio a um povo que vivia do cultivo da terra, plantando vinhas, trigais, olivais, e pastoreando animais (ovelhas, porcos), e da pesca no mar da Galiléia e no Jordão, o divino Mestre só se comunicava em parábolas magistralmente montadas a partir destes elementos da realidade social, para falar das coisas do Pai. Os profetas do passado, como Isaías, já previram que o Messias Salvador se comunicaria ao povo com parábolas. De acordo com Isaías, Ele falaria assim inclusive para confundir a muitos, segundo estas suas palavras: "Havereis de ouvir sem nada entender. Havereis de olhar sem nada ver".

Lembrando esta profecia, Mateus diz no Evangelho de hoje - Mt 13,1-23 - que Jesus, embora falando a todos, só explicou o sentido das parábolas aos seus mais próximos, como por exemplo, os discípulos, conforme a resposta que Ele deu a eles sobre a pergunta do por que Ele fala ao povo em parábolas?: "Porque a vós foi dado o conhecimento dos mistérios do reino dos céus, mas a eles não é dado... É por isso que Eu lhes falo em parábolas, porque olhando não vêem e, ouvindo, não escutam nem compreendem... Eles ouviram com má vontade e fecharam seus olhos, para não ver com os olhos, nem ouvir com os ouvidos, nem compreender com o coração, de modo que se convertam e Eu os cure".

No Evangelho deste domingo e dos próximos, ouviremos de Mateus a série de parábolas geniais inventadas por Jesus. No de hoje, temos a conhecidíssima parábola do Semeador que saiu a semear a semente, algumas caindo à beira da estrada, outras em terreno pedregoso, outras entre os espinhos, todas sem nada produzirem, e, por fim, outras caindo em terra boa, vindo cada semente a produzir na base de 100, 60 e 30.

E Jesus explicou o seu sentido somente aos discípulos: "Felizes sois vós porque vossos olhos vêem e vossos ouvidos ouvem". Quem ouve a palavra do reino e não a compreende, como a que foi semeada à beira do caminho e os pássaros a comeram, é o que a tem roubada de seu coração pelo maligno. Quem a acolhe com alegria, mas logo em seguida desiste da força de seu apelo em face de alguma provação ou sofrimento, é como a que caiu em terreno pedregoso que logo secou e morreu. Quem a recebe com satisfação, mas deixa que as preocupações do mundo e a ilusão da riqueza a sufoquem, é como a que brotou em meio aos espinhos e asfixiada definhou. Quem, contudo, a ouve e a compreende com todo o coração produz muito fruto, na base de 100, 60 e 30.

Nós bem sabemos que o dom da fé, esperança e caridade e da salvação é pura graça de Deus concedida a nós independentemente de nossos méritos. No dizer dos escolásticos: "Gratia gratis data" (graça dada gratuitamente). Explicando a parábola, Jesus deixa claro que o ouvir e o compreender a palavra tem o momento concomitante do acolher ou aceitar a palavra e o do corresponder ou do operar em favor dela. Isto é: do lidar com as tentações do maligno, com as provações do sofrimento e perseguições, com as preocupações do mundo e a ilusão das riquezas. Os escolásticos também diziam que a graça pressupõe o esforço humano e a natureza, não os prescindem, mas os plenificam: "Gratia praesupponit sibi naturam" (a graça pressupõe para si a natureza). Assim sendo, como toda graça é dom e empenho, pela parábola do semeador, Jesus nos pede acolher e compreender a palavra e operar, isto é, trabalhar em seu favor, contra dificuldades, preocupações e tentações. De acordo com o empenho de cada um é que cada semente da palavra produzirá na base de 100, 60 e 30.

Este ensinamento da teologia escolástica, o Pe. Kentenich, fundador da Obra Internacional de Schönstatt, o transformou numa singela, mas sábia oração: "Nada sem vós, nada sem nós!" Santo Inácio de Loyola, por sua vez, o expressou de outro modo: "No que tens a fazer, confia em Deus como se tudo dependesse dEle, mas aplica-te no fazer como se tudo dependesse de ti mesmo!"

"Quem tem ouvidos ouça!"

* Dom Caetano Ferrari é bispo de Bauru,SP.

Fonte: www.cnbb.org.br

Deixe uma resposta

dezesseis − 12 =