Israel-Palestina é um círculo infernal, mas rezar dará fruto, declara bispo auxiliar de Jerusalém

Salvatore Cernuzio

Massacre e tragédia: é difícil definir de outra maneira a situação na Terra Santa. Na Faixa de Gaza, continuam as mortes diárias. Entre disparos de mísseis e bombardeios, a população vive sob assédio e com medo constante. A diplomacia internacional invoca uma trégua entre Palestina e Israel e as Nações Unidas condenam os lançamentos de mísseis contra os territórios israelenses.

Enquanto isso, mulheres, crianças e famílias inteiras de Beit Lahya, ao norte de Gaza, se veem obrigadas a fugir de casa, sem malas e em jejum, para não sucumbir ao enésimo ataque do exército israelense. Uma situação insustentável, diante da qual o papa Francisco expressou o seu pesar e apelou, no ângelus de domingo passado, pelo fim das hostilidades.

ZENIT apresenta a seguir o testemunho de dom William Shomali, bispo auxiliar de Jerusalém e vigário patriarcal para a Palestina.

ZENIT: Excelência, o que está acontecendo na Terra Santa?

Dom Shomali: O que está acontecendo é uma reação ao sequestro e assassinato dos três jovens judeus em Hebron. O governo de Netanyahu atribui esse homicídio ao partido Hamas e reagiu com uma frenética busca dos criminosos, com muitas prisões, inclusive de ex-detentos. Enquanto isso, um jovem palestino de Shufat, um bairro de Jerusalém, foi sequestrado e queimado vivo por alguns extremistas israelenses. Esses fatos deram início a um círculo vicioso de violência. O exército de Israel atacou as bases do Hamas e da Jihad Islâmica em Gaza. Eles responderam com o disparo de mísseis, chegando a atingir os assentamentos próximos e as cidades de Haifa, Tel Aviv e Jerusalém. Esses mísseis, que são conhecidos pela imprecisão, fazem mais barulho do que destruição, mas provocam medo. Para os palestinos, o balanço é bem pior: 170 mortos, 1000 feridos e muitas casas destruídas em Gaza e nos territórios palestinos.

ZENIT: Qual é a origem deste conflito?

Dom Shomali: A razão principal é o fracasso do acordo de paz do mês de abril. O ministro americano Kerry, depois de nove meses de trabalho intenso, não conseguiu elaborar um quadro político para os futuros negociadores. Essa derrota criou no coração dos palestinos um desespero que aumentou por causa da contínua construção de novos assentamentos israelenses. Estas construções são vistas como um contínuo motivo de guerra. E acrescente a tensão entre dois povos, com a religião fazendo parte do problema e sendo uma causa agravante.

ZENIT: Como explicar este aumento de violência em Gaza poucas semanas depois da visita do papa Francisco e dos seus apelos pela paz e pela reconciliação?

Dom Shomali: A visita do papa suscitou muitas esperanças, mas logo depois veio muita desilusão. Foi parecido com o que aconteceu na peregrinação de São João Paulo II em março de 2000: seis meses depois da visita dele, começou a segunda Intifada. Nos dois casos, a violência foi se desencadeando por causa do fracasso das negociações. No primeiro caso, depois do fracasso de Camp David. No segundo, depois da mediação americana. Sobre o encontro de oração nos Jardins Vaticanos, eu reitero o que o Santo Padre disse no ângelus: a oração sempre dá frutos, mesmo que seja no longo prazo. Como no caso da oliveira, plantada no fim do encontro, cujo florescimento demora muitos anos. É necessário reiterar também que as palavras do pontífice na "Invocação pela Paz" continuam valendo como o único caminho justo rumo à paz. O papa fez entender que as negociações por si sós não bastam, como a história nos ensina, e que é necessário entrar também num outro horizonte, que é o da oração.

ZENIT: Nestes conflitos, as primeiras vítimas são os jovens. Na sua opinião, a origem de tudo isso é um problema de educação?

Dom Shomali: É verdade que os jovens são vítimas deste conflito, sem esquecer as crianças, frágeis e traumatizadas pelos bombardeios e pelo medo. As consequências nós vamos ver no futuro. Agora eles cultivam o ódio e o desejo de vingança. O ódio foi nutrido por uma longa história de violência em que cada lado culpa o outro. Essa falsa retórica não ajuda. O ódio só pode ser eliminado pela educação nos valores da justiça, da paz e da reconciliação. Mas a educação tem que coincidir com passos concretos, reconhecendo os direitos de cada lado: o dos palestinos à dignidade, com um país viável, e o dos israelenses à segurança e ao reconhecimento do mundo árabe e islâmico.

ZENIT: Como os adultos reagem diante desses horrores que afetam as novas gerações? Não são eles mesmos que empurram os jovens para o combate?

Dom Shomali: É paradoxal dizer que são os jovens que saem às ruas espontaneamente e vão até os postos de controle desafiar os soldados israelenses, enquanto o governo palestino não deseja esse enfrentamento com o exército israelense. Os jovens estão imersos num círculo vicioso. É urgente que a comunidade internacional encontre uma solução e a imponha a ambas as partes. Todos vivem num círculo infernal, em que tanto os adultos quanto os jovens estão presos e não sabem como sair.

ZENIT: Como o resto da população, em especial os cristãos, está reagindo a tudo isso?

Dom Shomali: Os cristãos, tanto os palestinos quanto os israelenses, sofrem como todos os outros moradores desta terra. Eles temem que a situação piore e temem as consequências sociais e econômicas. Eles rezam pela paz e, na grande maioria, rejeitam a violência. É raríssimo vê-los sair às praças e recorrer à violência. Eles também são os mais frágeis diante da tentação de emigrar. Durante a última Intifada, muitos jovens e famílias cristãs deixaram a Terra Santa para buscar em outro lugar uma vida mais segura e digna. Para eles é difícil resistir a essa tentação. E para nós é difícil convencê-los a não abandonar esses lugares e fazê-los entender que viver aqui é um privilégio e uma vocação.

ZENIT: Como é que vocês, como Patriarcado Latino de Jerusalém, tentam se mostrar próximos dessas pessoas que vivem no medo, à mercê de bombardeios?

Dom Shomali: Nós estamos próximos com a oração e com a ajuda humanitária, que organizamos do jeito que podemos. Neste momento, não podemos fazer nada pelas pessoas de Gaza. Quando as hostilidades terminarem, nós vamos visitá-las e ver como ajudar. Por enquanto, temos que nos limitar a telefonar todos os dias para o nosso pároco de Gaza e pedir as últimas notícias.

ZENIT: Na sua opinião, existe esperança de que essa tempestade de violência e morte acabe? Ou, como muitos temem, é iminente a explosão de uma terceira Intifada?

Dom Shomali: É verdade que nem o governo palestino nem o governo israelense querem uma terceira Intifada. Ninguém sairia vitorioso. As consequências são ruins para todos. Um exemplo: os peregrinos começaram a cancelar reservas. Já sabemos por experiência o quanto é difícil retomar o fluxo do turismo depois de um conflito. Nós rezamos a Deus para que esses enfrentamentos acabem rápido.

Fonte: www.zenit.org

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