COP 27 e o futuro do planeta

Os últimos sete anos, de 2015 a 2021, foram os mais quentes já registrados. A média global da temperatura de 2018–2022 é estimada em 1,17 (cerca de 0,13°C) acima da média de 1850–1900.

Por Juacy da Silva

“Os países que irão participar da COP 27, devem se comprometer realmente a estabelecer as ações climáticas, para combater o aquecimento global e as mudanças climáticas, como a primeira e mais importante prioridade para suas políticas públicas pelos próximos anos, a partir de 2023. É urgente que os países passem das promessas e discursos para ações efetivas, só assim vamos atingir as metas estabelecidas e aceitas por todos os países no Acordo de Paris”. António Guterres, em pronunciamento nas Nações Unidas, sobre a questão das mudanças climáticas.

amazoniaA partir de domingo, 6 de novembro de 2022 até o próximo dia 18, as atenções mundiais estarão voltadas para a cidade de Sharm El Sheikh, no Egito, quando e onde estará sendo realizado a COP 27, mais uma reunião internacional para discutir a questão das mudanças climáticas, suas causas e consequências para o futuro do Planeta Terra.

Desde 1972, quando foi realizada a primeira Conferência Mundial sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente, em Estocolmo, na Suécia, ou seja, há 50 anos, e diversas outras conferências mundiais como a Rio 92; a Rio Mais 20 (em 2012) e outras mais desde então, esses temas voltam à Agenda Mundial.

Cabe um destaque especial nesta caminhada de enfrentamento mundial deste desafio que são as mudanças climáticas o estabelecimento do Protocolo de Kyoto, em 1997, por ocasião da Conferência das Partes III, (organismo supremo da ONU para as questões das mudanças climáticas), na mesma cidade, no Japão, protocolo este aprovado e firmado por 143 países e territórios.

Participaram daquela conferência, da qual resultou o Protocolo de Kyoto, um marco significativo na luta contra o aquecimento global, contra a degradação ambiental, contra o aumento da emissão dos gases de efeito estufa que provocam o aquecimento global e as mudanças climáticas, além dos representantes oficiais dos governos, também a presença de milhares de representantes das organizações da sociedade civil desses países, de ONGs, entidades empresariais, pesquisadores de diversas instituições acadêmicas e centros de estudos e pesquisas do mundo todo, além de milhares de ativistas ambientais, pessoas que lutam por um mundo realmente sustentável.

O Protocolo de Kyoto, apesar de ter sido aprovado em 1997, só entrou em vigor em 2005 e estabelecia metas e prazos para que os países pudessem ajustar suas agendas e políticas nacionais às metas globais aprovadas no citado Acordo.

Um dos objetivos do Protocolo de Kyoto constava que um cronograma deveria ser estabelecido, para que os países fossem obrigados a reduzir, em 5,2%, a emissão de gases poluentes, entre os anos de 2008 e 2012 (primeira fase do acordo), quando o Acordo deveria ser avaliado, o que acabou acontecendo somente em 2015 através do Acordo de Paris.

Entre as metas do Protocolo de Kyoto constava, por exemplo: aumento no uso de fontes de energia limpas (biocombustíveis, energia solar, eólica, biomassa); proteção das florestas e outras áreas verdes, redução do desmatamento; otimização de sistemas de energia e transportes; redução do uso de combustíveis fósseis; redução das emissões de gases de efeito estufa por todos os setores produtivos, inclusive o gás metano, presentes em depósitos de lixo e oriundos das atividades agropastoris; definição de regras para a emissão dos créditos de carbono (certificados emitidos quando há a redução da emissão de gases poluentes) e definição de mecanismos para regular o mercado de carbono.

A expectativa dos especialistas em clima e meio ambiente era de que o sucesso do Protocolo de Kyoto pudesse diminuir a emissão desses gases de efeito estufa e o aumento da temperatura média global pudesse ficar entre 1,5 e 2,5º C até o final do século XXI. Desta forma, o ser humano poderia evitar as catástrofes climáticas de alta intensidade que estavam sendo previstas para o futuro, mas que acabou chegando muito antes do esperado e já são uma realidade atual.

Todavia, relatórios posteriores ao que foi definido no Protocolo de Kyoto em 1997, ate os termos estabelecidos no Acordo do Clima de Paris, em 2015 e até a presente data, quando estará sendo realizado a COP 27, a partir deste domingo, no Egito em 2022; ou seja, 25 anos após aquelas decisões, é de que os países que firmaram e firmam tais acordos, comprometem-se livre e soberanamente a cumprir determinadas metas, acabam deixando tudo apenas no papel e pouco ou nada cumprem, com raras exceções.

No último dia 13 de setembro deste ano (2022) quando da apresentação de mais um Relatório da Organização Climática Mundial, o Secretário da ONU, demonstrou, em seu pronunciamento, uma grande preocupação com o aumento constante das emissões de gases de efeito estufa e os poucos avanços quanto `a redução do uso de combustíveis fósseis, ao desmatamento, à degradação ambiental, o aquecimento tanto do planeta quanto dos oceanos, o aumento da produção de lixo, principalmente de plásticos, enfim, uma série de fatores que estão acelerando o aquecimento global e provocando sérias mudanças climáticas, que, ao que tudo indica, podem ser irreversíveis nos danos causados.

O titulo da matéria divulgada pela mídia da ONU não deixa dúvidas quanto a esta preocupação quando diz, textualmente, “ONU alerta e diz que o mundo caminha para uma direção errada, quanto às mudanças climáticas’.

Disse então António Guterres, Secretário Geral da ONU, na ocasião: “Os esforços precisam ser sete vezes maiores que os realizados até aqui/agora, para que as metas estabelecidas no Acordo de Paris (e também no Protocolo de Kyoto), para alcançar, de fato, as metas estabelecidas naqueles acordos e tratados, bem como o que consta dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (Agenda 2030), principalmente os seguintes: Erradicação da Pobreza; Fome zero e agricultura sustentável ; Água potável e Saneamento; Energia Acessível e Limpa; Cidades e comunidades sustentáveis; Consumo e produção responsáveis; Ação contra a mudança global do clima; Vida na água ; Vida Terrestre; Parcerias e meios de implementação.

Como podemos perceber, 10 dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável estabelecidos em 2015; dez dos mesmos estão relacionados, direta ou indiretamente, com a questão das mudanças climáticas.

Em outro trecho de seu pronunciamento, cuja gravidade pode ser percebida claramente, o Secretario Geral da ONU alinha diversos aspectos, que, certamente, deverão estar na pauta das discussões da COP 27.

Vejamos, para ele, é “escandaloso” que os países desenvolvidos, e também os emergentes, como Brasil, não tenham levado a sério a adaptação e tenham “desprezado seus compromissos de ajudar o mundo subdesenvolvido ou em desenvolvimento”. O secretário-geral das Nações Unidas lembrou que as necessidades de financiamento de adaptação/mitigação devem crescer para pelo menos US$ 300 bilhões por ano até 2030, ou seja, um volume de US$2,4 trilhões de dólares para ações ambientais nos países mais pobres, além do que os países desenvolvidos e emergentes, principalmente os integrantes do G20 deveriam investir diretamente neste setor.

O Secretário Geral da ONU, António Guterres também esteve recentemente no Paquistão, onde disse que testemunhou a destruição causada pelas inundações.

Assim, ele destacou a importância de garantir que pelo menos 50% de todo o financiamento climático seja destinado à adaptação/mitigação.

Níveis atmosféricos de dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O) continuam a aumentar. A redução temporária das emissões de CO2 em 2020 durante a pandemia teve pouco impacto no crescimento das concentrações atmosféricas - o que permanece na atmosfera depois que o CO2 é absorvido pelo oceano e pela biosfera.

As emissões globais de CO2 fóssil em 2021 retornaram aos níveis pré-pandêmicos de 2019 depois de cair 5,4% em 2020 devido a bloqueios generalizados. Dados preliminares mostram que as emissões globais de CO2 em 2022, de janeiro a maio, estão 1,2% acima dos níveis registrados no mesmo período de 2019, impulsionadas por aumentos nos Estados Unidos, Índia e na maioria dos países europeus.

Os últimos sete anos, de 2015 a 2021, foram os mais quentes já registrados. A média global da temperatura média de 2018–2022 (com base em dados até maio ou junho de 2022) é estimada em 1,17 (cerca de 0,13°C) acima da média de 1850–1900.

Cerca de 90% do calor acumulado no sistema terrestre é armazenado no oceano, o teor de calor do oceano para 2018-2022 foi maior do que em qualquer outro período de cinco anos, com as taxas de aquecimento dos oceanos mostrando um aumento particularmente forte nas últimas duas décadas.

Novas promessas nacionais de mitigação para 2030 mostram algum progresso na redução das emissões de gases de efeito estufa, mas são insuficientes. A ambição dessas novas promessas precisaria ser quatro vezes maior para limitar o aquecimento a 2°C e sete vezes maior para chegar a 1,5°C.”

Outro fator importante que está contribuindo para o aumenta dos níveis de emissão de gases de efeito estufa é a guerra entre a Rússia e Ucrânia, tendo em vista que a Rússia cortou o fornecimento de gás natural (também uma fonte de energia de origem fóssil) obrigando os países europeus a voltarem a usar o carvão como fonte de energia, o que aumenta, sobremaneira as emissões desses gases e impedem que as metas estabelecidas no Acordo de Paris sejam atingidas.

A COP 27, como as demais conferências do clima ja ocorridas, inclusive a última, em Glasgov, no Reino Unido em 2021, são grandes eventos, e nesta serão mais de 2000 palestras , conferências, seminários, mesas redondas, encontros bilaterais, sobre diversos temas relacionados com o meio ambiente, com foco principal, nas mudanças climáticas; contará com mais de 35 mil participantes que estarão discutindo mais de 300 temas socioambientais de extrema relevância para o futuro da humanidade e do planeta.

Além dessas discussões, durante dois dias deverão ser realizadas reuniões dos líderes mundiais, chefes de governo e de Estado, com apoio de suas delegações oficiais.

No caso do Brasil, tendo em vista que o atual Governo termina seu mandato no final de dezembro próximo, o Presidente da COP 27 que também é o Presidente do Egito, houve por bem convidar para participar deste mega evento internacional, o ex- Presidente e Presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, que iniciará sua gestão a partir de 01 de Janeiro de 2023.

Este, além de um gesto de reconhecimento ao papel que o Brasil ao longo das últimas décadas tem desempenhado nos fóruns internacionais relacionados com questões ambientais e climáticas, principalmente no decorrer das gestões de FHC, Lula e Dilma, representa o retorno de nosso país a esses fóruns e impõe também que um grande desafio se apresenta ao novo Governo (Lula) que é reconstruir a política, os planos, programas e gestão ambiental, bastante distorcidas, desvirtuadas e sucateadas nos últimos anos.

O bom senso indica que se os países através de seus governantes firmam um Acordo ou Protocolo internacional isto deveria servir de base para a definição de políticas públicas, planos e programas de governo, com vistas a, realmente, atingir as metas estabelecidas, cujo prazo ficou convencionado que seria 2030, daí o nome desses objetivos como AGENDA 2030.

O Brasil tem deixado de agir para o cumprimento de vários desses objetivos e suas centenas de metas, o que nos coloca entre os países que continuam poluindo, degradando, destruído o meio ambiente, contribuindo, assim também para o aumenta do aquecimento global e as mudanças climáticas.

Uma meta clara estabelecida, em decorrência da gravidade do Quadro de aquecimento global do planeta e das mudanças climáticas disso resultante seria a limitação até 2060 ou no máximo até final deste século, é a de que seria estabelecido o limite de 1,5 graus ou no máximo 2,5 graus no aumento da temperatura mundial, tomando-se como referência o inicio do período industrial.

O Fórum Econômico Mundial, em Janeiro de 2022, apresentou A 17ª edição do Relatório de Riscos Globais, que afetam a vida dos países e podem colocar em risco a própria sobrevivência humana no planeta. O total desses riscos chegam a 17, com destaque para os dez que maiores impactos podem causar.

Dentre os dez maiores e mais graves riscos, nada menos do que sete, estão relacionados com o meio ambiente. Esses riscos, pela ordem de gravidade, são os seguintes: 1) falência das ações climáticas; 2) mudanças climáticas extremas; 3) perda/destruição da biodiversidade; 5) crise da sobrevivência humana; 6) aumento das doenças infectocontagiosas (epidemias e pandemias); 7) degradação do meio ambiente; 8) crise nos/dos recursos naturais (super exploração e degradação).

Oxalá, o Brasil possa reconstruir sua imagem de uma potência Ambiental e possa incluir todos os compromissos já assumidos desde a ECO 92 até a última COP 26 (2021) e as que serão aprovados neste COP 27, como bases para estabelecer uma nova política ambiental, visando a justiça socioambiental, a justiça intergeracional e a um processo de desenvolvimento que respeite a um só tempo o crescimento econômico, equidade na distribuição dos frutos desse crescimento econômico, os direitos dos trabalhadores e também `a proteção do meio ambiente, atendendo aos princípios e valores contidos nos tratados internacionais dos quais nosso país faça parte e também no que preconiza a Encíclica Laudato Si e a Exortação Apostólica Querida Amazônia, ambas de autoria do Papa Francisco.

Acabamos de sair de uma eleição geral, quando o povo brasileira, democraticamente elegeu parlamentares estaduais, federais, governadores e o Presidente da República, quando era de se esperar que nas discussões e debates políticos pudessem constar propostas e planos de governos e de ação política diversos problemas e desafios que afetam o Brasil e sua população, inclusive as questões ambientais.

Mas não foi isso o que aconteceu, essas pautas fundamentais para o presente e futuro do país foram substituídas por “fake news”, calúnias, difamações e ofensas de baixo nível, até com palavras de “baixo calão”, baixarias ou temas que não estão na ordem de prioridade nacional e muito menos internacional, com as questões das mudanças climáticas, aquecimento global, degradação ambiental e outras correlatas.

Não podemos esquecer que só existe um Planeta Terra, não existe “Planeta B”, ao destruirmos este planeta estamos destruindo todas as formas de vida, inclusive a vida humana! Ai não terá como a boiada passar e nem onde viver.

Juacy da Silva, professor titular e aposentado Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, articulador da Pastoral da Ecologia Integral, ambientalista. Email profjuacy@yahoo.com.br Instagram @profjuacy Whats app 65 9 9272 0052

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