Papa Francisco e a reconciliação brasileira

­­­­­­A história do Brasil não terminou no dia 12 de maio de 2016. O próprio tempo se encarrega de julgar os que se dizem vitoriosos.

Por Roberto Malvezzi (Gogó)*

Os que disseminaram o ódio até ontem, hoje amanheceram pedindo paz e reconciliação. O mote instrumentalizado foi o pronunciamento do Papa Francisco que “disse estar rezando pela paz e harmonia no Brasil”.

PAPA-FRANCISCO-CABECA-BAIXANa verdade, o Papa tinha acabado de receber Letícia Sabatella, como representante dos movimentos populares. Uma das preocupações dela dita ao Papa, mas já tantas vezes expressa por ela em outras circunstâncias, “é a do ódio, da raiva, que tomou conta do Brasil”. Portanto, sem manipulação a frase do Papa pode ser devidamente entendida.

Os cristãos – tento ser um deles – não tem direito ao ódio, à vingança ou à retaliação. Jesus disse que o distintivo de um cristão “é o amor ao inimigo”. Não pode haver desafio maior para um ser humano, ainda mais num momento como esse.

Entretanto, ele mesmo nos proibiu a prática das injustiças, ou a conivência com elas, ou a compactuação com o mal em geral. Então, essa distinção fina entre o ódio e a indignação é um dom o Espírito Santo, dimensão do dom do discernimento.

Já diziam os profetas bíblicos que “a paz é fruto da justiça”. A verdadeira reconciliação não é um acordo de gabinete, nem um acerto nos moldes Herodes e Herodíades sobre a cabeça de João Batista.

A verdadeira reconciliação só é possível com a superação das injustiças. Portanto, traduzindo para os dias atuais, não é possível a reconciliação brasileira enquanto não houver reconhecimento dos direitos de todos os brasileiros, a partir dos historicamente excluídos, como negros, índios, pobres, mulheres e as novas demandas da sociedade contemporânea.

Não é possível a reconciliação verdadeira com golpes, com a subtração dos direitos dos aposentados, dos trabalhadores, sem o saneamento, sem habitação digna para todos, sem o respeito pela pluralidade. ­­Ou como disse Francisco em outra ocasião, o mínimo é “com terra, com teto, com trabalho”.

A história do Brasil não terminou no dia 11 de Maio de 2016. O próprio tempo se encarrega de derrotar os que se julgam vitoriosos.

Prossigamos sem ódio, mas sem conivência, submissão ou bajulação.

Aí sim, que Nossa Senhora Aparecida nos ajude para encontrarmos a verdadeira reconciliação a partir da superação das injustiças.

*Roberto Malvezzi (Gogó) é agente da Comissão Pastoral da Terra, Juazeiro, BA.

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