Páscoa evento essencial

Patrick Gomes Silva*

O evento pascal de Jesus, sua morte e ressurreição é o elemento central e fundamental de toda a nossa fé. É em torno dele que a nossa liturgia se organiza, portanto, é fundamental para nos entendermos como cristãos. A celebração da Páscoa convida a fazer a experiência que os discípulos fizeram com Jesus. Antes de mais nada, o acompanharam pelas estradas da Galileia, da Samaria, da Judeia, onde foram descobrindo um jeito novo de ser e viver. No final dessa caminhada um acontecimento especial iria marcar as suas vidas de forma permanente. Ao longo do percurso, foram vendo um Jesus vitorioso em todas as batalhas, sobre a doença, os demônios, as tristezas... Em todas as situações, Jesus espalhava o esplendor da vida. Mas agora a situação parecia bem mais difícil, se encontravam em Jerusalém e a batalha ganhava outros tons. Seria Jesus capaz deste duelo? O duelo mal se aproximava e já os companheiros fiéis de Jesus partiam em debandada, alguns já nem mais o "conheciam", e ainda a "batalha" estava para começar. Poucos colocavam fé neste Jesus! Porém, a vida venceu!

Este evento não aconteceu por acaso, mas como veremos, foi fruto do caminho feito por Jesus. Foi, e continuará sendo, uma experiência marcante para os que se dizem discípulos Dele. Assim, entender como os primeiros discípulos viveram e entenderam esse evento, ajudará os discípulos de hoje a viverem bem este acontecimento. Para isso, o texto de Atos 10, 34.37-43 servirá de orientação.

Atos dos Apóstolos
O livro é de autoria de Lucas, autor também do Evangelho, e provavelmente foi escrito em torno dos anos 80 e 90. É uma fase em que a Igreja já se encontra organizada e estruturada, mas em que começam a surgir "falsos mestres", com propostas doutrinais estranhas e, às vezes, pouco cristãs. Neste ambiente, as comunidades cristãs sentem a necessidade de critérios claros que lhes permitam discernir o verdadeiro ensinamento de Jesus. É neste contexto que se insere a obra de Lucas.

No livro dos Atos, Lucas apresenta como a Igreja nasce da Palavra de Jesus, fielmente anunciada pelos apóstolos e é esta mesma Igreja, que animada pelo Espírito e fiel à doutrina transmitida por eles, tornará presente o plano salvador do Pai e o fará chegar a toda a humanidade.

Experiência de Pedro
Neste texto em concreto, Lucas nos propõe o testemunho e a catequese de Pedro em Cesareia, em casa do centurião romano Cornélio. Convocado pelo Espírito (veja At 10, 19-20), Pedro entra em casa de Cornélio, apresenta-lhe o essencial da fé e o batiza. Não só a ele, mas também toda a sua família (veja At 10, 23b-48). O episódio é importante, porque estamos perante o primeiro caso em que um pagão "a cem por cento" é admitido ao cristianismo por um dos Doze (o etíope que encontramos em At 8, 26-40 sendo batizado por Filipe, já era "prosélito", isto é, simpatizante do judaísmo). Significa que a vida nova que nasce de Jesus é para todos, sem qualquer exclusão.

O anúncio de Pedro
Pedro começa por anunciar Jesus como "o ungido", que tem o poder de Deus, e segue descrevendo seus atos: "passou fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos". De imediato dá testemunho da morte na cruz e da ressurreição. Conclui acerca da dimensão salvífica: "quem acredita n'Ele recebe, pelo seu nome, a remissão dos pecados". Esta catequese refere-se também, com alguma insistência, ao testemunho dos discípulos que acompanharam muito de perto, a caminhada histórica de Jesus.

Interessante notar como a ressurreição de Jesus não é apresentada como um evento isolado, mas sim como o culminar de uma vida que transcorreu num determinado estilo. Depois de Jesus ter passado pelo mundo "fazendo o bem e libertando todos os que eram oprimidos", depois de ter morrido na cruz como consequência desse "caminho", Deus ressuscitou-O. Esta vida, vivida na entrega e no dom, é uma proposta transformadora que, uma vez acolhida, liberta da escravidão do egoísmo e do pecado. E os discípulos? Eles são aqueles que aderiram a Jesus, acolheram a sua proposta libertadora e ressuscitam, à medida que a sua vida se identifica com a de Jesus; mas, além disso, eles são as testemunhas de tudo isto: é absolutamente necessário que esta proposta de ressurreição, de vida plena, de vida transfigurada, chegue a todos. É que essa proposta de salvação é universal e deve atingir, através dos discípulos, todos os povos da terra, sem distinção.

Refletindo
A ressurreição de Jesus é a consequência de uma vida gasta "fazendo o bem e libertando os oprimidos". Isso significa que, sempre que haja um esforço por vencer o egoísmo, a mentira, a injustiça e por fazer triunfar o amor, ressuscitamos. Significa que sempre que alguém se dá aos outros e manifesta em gestos concretos a sua entrega aos irmãos e irmãs, ressuscita.

A ressurreição de Jesus significa, também, que o medo, a morte, o sofrimento, a injustiça deixam de ter poder sobre o discípulo que ama, que se dá, que partilha a vida. Ele tem assegurado a vida plena, essa vida que os poderes deste mundo não podem atingir nem restringir. Ele pode, assim, enfrentar o mundo com a serenidade que lhe vem da fé. Aos discípulos pede-se também que sejam as testemunhas da ressurreição. Nós não vimos o sepulcro vazio, mas fazemos todos os dias a experiência do Senhor ressuscitado, vivo e caminhando ao nosso lado nos caminhos da história. Temos de testemunhar essa realidade. No entanto, é preciso que o nosso testemunho seja comprovado por fatos concretos: por essa vida de amor e de entrega que é sinal da vida nova de Jesus em nós.

* Patrick Gomes Silva, imc, é diretor do Centro Missionário José Allamano. www.palavramissionaria.com. Publicado na revista Missões, n.03 - Abril 2011.

Fonte: Revista Missões

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