Luta por direitos # "birra de crianças"

“Negar os direitos humanos das pessoas é questionar a própria humanidade delas”. (Nelson Mandela)

Por Nei Alberto Pies*

David Coimbra, ao manifestar contrariedade com os que se organizam publicamente para reivindicar direitos, em artigo escrito no jornal Zero Hora (Porto Alegre) de 08 de dezembro de 2015 enfatiza: “A diferença entre querer e poder” afirma grande verdade que move os lutadores sociais: “lutar pelos direitos é um exercício de cidadania”. Por outro lado, levianamente, compara a luta por direitos sociais com atitude de crianças mimadas, algo inaceitável para os lutadores sociais.

direitoshumanosOra, organizar-se para a conquista de direitos sociais como moradia, saúde, segurança, terra, educação não é “birra de crianças”. É atitude corajosa e destemida de poucos brasileiros que fazem da rua “palco de sua cidadania”. Movimentos sociais e de cidadania não resultam de direitos ou interesses individuais, mas se estruturam na organização e ação coletivas e de interesses de alcance social e comunitário. Por isso mesmo, são realizados em vias ou praças públicas, com a pretensão de reclamar, denunciar e exigir efetividade de direitos já garantidos na Constituição Brasileira.

Caro jornalista, lutar não é crime! O fato dos direitos estarem garantidos na Constituição não diz nada. Gilberto Dimenstein dá a senha: “não podemos viver de cidadania de papel”. Historicamente, direitos humanos e sociais no Brasil e no mundo são frutos de organização social com poder de influenciar governos e exigir implementação de políticas públicas. Inaceitável criminalizar, ironizar ou debochar daqueles que lutam por melhores condições de dignidade humana no Brasil e no mundo. Inaceitável, numa democracia, que a violência instituída (de repressão física ou moral) seja aceita como normal e necessária.

A democracia acontece nas contradições, na dureza da cidadania cotidiana, difícil de ser construída. Nem todos estão convencidos que a democracia pode conviver com uma “certa desordem”. Assim definiu Juremir Machado da Silva: “não existe democracia sem caos, confusão, entropia. A democracia é o sistema do dissenso. Na verdade, a democracia é um equilíbrio instável de ordem e desordem. Em alguns momentos, a desordem é mais importante do que a ordem. Tudo, claro, depende do grau de ordem e desordem”.

A criminalização é a face perversa do Estado e da sociedade que não permitem que a cidadania seja exercida na perspectiva dos “sujeitos de direitos”. Quem luta por seus direitos, e pelos direitos dos outros é ligeiramente taxado, acusado e condenado sumariamente. Os estigmas e preconceitos sociais atribuídos àqueles que lutam anulam a vivência de uma cidadania plena e ativa.

Ninguém sai de uma manifestação pública com os direitos já conquistados, mas toda manifestação pode indicar avanços para a materialização dos mesmos. As manifestações e protestos são a materialização da democracia, através da palavra. Marcos Rolim disse que “a democracia que temos já não tem política. Nela, o futuro se ausentou porque as palavras não autorizam expectativas. Será preciso reinventá-la, entretanto, antes de desesperar. Porque o desespero é só silêncio e o melhor do humano é a palavra”.

Chance aos direitos enquanto ouvirmos vozes na rua!

*Nei Alberto Pies, professor, escritor e ativista de direitos humanos.

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