Afronta à cidadania

Mércia Miranda Vasconcellos *

Os moradores de Jacarezinho-PR, há mais de oito anos, vivem uma situação de ilegalidade que macula a cidadania. Uma concessão feita pela União Federal e Estado do Paraná permitiu a instalação de uma praça de pedágio no entroncamento das rodovias BR 369, BR 153 e PR 092. Com o pedágio, os moradores do Município viram-se obrigados a pagar um valor exorbitante cada vez que iam e vinham do município por aquela rodovia, porque não há rodovia alternativa para fazer o percurso.

Inconformado com essa situação, um grupo liderado pela professora Ana Lúcia Baccon iniciou um movimento de insurgência contra a instalação do pedágio: Movimento Fim do Pedágio que encampou a luta pela desinstalação da praça de arrecadação do pedágio no município de Jacarezinho. Esse grupo enviou ao Ministério Público da União o relato da situação caótica em que se encontrava o município e pediu providências jurídicas para o caso.

Após constatar TODAS as irregularidades da praça de pedágio, em 2006, o Ministério Público Federal propôs a Ação civil pública n.º 2006.70.13.002434-3/PR contra a empresa concessionária ECONORTE e contra os entes federativos que fizeram a concessão do serviço público: UNIÃO, ESTADO DO PARANÁ, DNIT, DER/PR, pedindo a declaração da nulidade da cobrança do pedágio, bem como a condenação da concessionária a devolver aos usuários os valores cobrados.

A ação tramitou na Justiça Federal da Subseção Judiciária de Jacarezinho e foi julgada pelo juiz federal Mauro Spalding que prolatou uma belíssima sentença declarando a nulidade do pedágio e ordenando o fechamento da praça de arrecadação em Jacarezinho (a sentença pode ser acessada no site www.trf4.jus.br). Inconformada com a decisão, a concessionária Econorte interpôs o recurso de apelação perante o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região - TRF4, em Porto Alegre, mas o referido Tribunal MANTEVE a sentença de primeiro grau e confirmou a ordem de paralisação da cobrança do pedágio na praça de Jacarezinho.

Diante de mais uma decisão desfavorável a ela, a Econorte, imediatamente e valendo-se dos meios jurídicos que o Direito dispõe, propôs, junto ao Tribunal Regional Federal da 4.ª Região uma suspensão dos efeitos da sentença, em outras palavras, a Econorte pediu, via recurso, que o TRF4 suspendesse a decisão do juiz de primeiro grau de "fechar as cancelas". O Tribunal NEGOU o pedido e manteve a decisão do juiz federal.

Inconformada (ou desesperada), a Econorte, valendo-se, por óbvio, das várias oportunidades que o sistema jurídico dispõe aos litigantes, propôs perante o Superior Tribunal de Justiça - denominado Tribunal da Cidadania - Medida Cautelar Inominada para suspender a decisão do juiz. E, MAIS UMA VEZ, a decisão foi favorável ao fechamento do pedágio (note-se que já há 3 (três) decisões ordenando o fechamento da praça de pedágio).

Em dezembro de 2009, a Econorte buscou guarida junto a outro tribunal, agora o Supremo Tribunal Federal, o guardião da nossa Constituição, e em dezembro de 2008, com uma decisão a seu favor, proferida pelo presidente do STF Gilmar Mendes, na SL 274/PR, SUSPENDEU os efeitos de TODAS as (três) decisões favoráveis ao cidadão.

Por óbvio, o Ministério Público Federal, inconformado com a decisão do presidente do STF, interpôs um recurso denominado Agravo regimental que está nas mãos do presidente desde 09.02.2009 sem que ele leve a plenário para julgamento. Em outras palavras, desde 09.02.2009, UM ANO, o presidente da corte máxima do nosso país está ‘guardando" uma ação, enquanto deveria tê-la feito andar e ser julgada para que houvesse uma resposta ao cidadão. Sim ou não, mas uma resposta.

Essa é a história que a população de Jacarezinho vive: quatro anos de instalação de uma praça de pedágio, ilegal e mais quatro anos de luta contra o pedágio ilegal. Nessa luta, há três decisões favoráveis que não podem vigorar porque o ministro da mais alta corte do nosso país não leva o caso para julgamento.

Cobramos tanto a efetivação de nossa cidadania, já protegida constitucionalmente, mas temos de nos conscientizar de que essa efetivação depende de cada um de nós. É uma realização que não deve vir de cima, mas da nossa realidade diária, das nossas lutas e conflitos diários. Precisamos começar a lutar por nós mesmos, pela nossa cidadania.

Se você se sensibilizou com esse relato e quer ajudar a efetivar a nossa cidadania, acesse o site www.stf.jus.br, vá à central do cidadão e faça uma reclamação. Além disso, vá ao site www.cnj.org.br, vá à ouvidoria e faça a mesma reclamação. Vamos pressionar para que o ministro leve esse caso a julgamento.

Todos nós sabemos que cobrar um Ministro do STF é muito difícil e nós nos sentimos "muito pequeninos" em relação a ele, mas se fizermos isso JUNTOS, a força que surgirá da união fará a diferença.

* Procuradora do Estado do Paraná e professora universitária

Deixe uma resposta

cinco × 2 =