Prioridade Negra

Para os missionários e as missionárias da Consolata, celebrar o Dia da Consciência Negra (20 de novembro) é viver o dia a dia respeitando o povo afro-brasileiro.

Por PauloMzé*

Padre Jacques Kwangala Mboma, missionário da Consolata, trabalha com a Pastoral Afro em Engenheiro Pedreira, Japeri, estado do Rio de Janeiro. A Pastoral é uma das prioridades escolhidas pelo IMC para desenvolver sua missão evangelizadora. Em entrevista, padre Jacques fala de seu trabalho.

Poderia indicar alguns fatos históricos da caminhada da Pastoral Afro na Região Brasil?

A prioridade da Pastoral Afro-brasileira foi escolhida em 1997 pelos missionários da Consolata, com ajuda das Irmãs Vitalina e Arturina Menezes na Paróquia São Brás, localizada no bairro de Plataforma, no Subúrbio Ferroviário de Salvador, Bahia. Essa Pastoral desenvolveu ao longo dos últimos anos ações sociais que tinham como objetivo principal promover o bem-estar social e a cultura afro-baiana, priorizando sempre as situações, pessoas e/ou grupos mais desfavorecidos ou excluídos. Foi a Pastoral que permitiu a criação da Ação Social da Paróquia São Brás de Plataforma (ASPASB), uma organização civil, não governamental, de princípios cristãos (católicos), reconhecida de Utilidade Pública pelo Governo Municipal e Estadual da Bahia. Em 1998, a Pastoral Afro-brasileira da Paróquia São Brás de Plataforma juntamente com os estudantes que já haviam conseguido ingressar nas Universidades públicas e particulares do Estado, começaram a discutir e pensar na possibilidade de trazer essa experiência para o bairro de Plataforma para poder atender mais pessoas, economizando tempo e recursos financeiros para os candidatos. Depois de longas reuniões, mobilização da comunidade local em relação à importância de um curso Pré-vestibular alternativo no próprio bairro e respondendo aos desafios lançados pela Campanha da Fraternidade de 1998 com o tema: A Fraternidade e o Negro, a paróquia fundou o Curso Pré-vestibular Alternativo do COEQUILOMBO e Quilombinho para os adolescentes, como uma resposta concreta aos desafios mencionados.

Quais são as principais ações que a pastoral tem desenvolvido, não obstante a pandemia?

O encontro de formação que acontece todas as terceiras terças-feiras do mês. Porém, recomeçamos esses encontros somente em outubro por conta da Covid-19. Os pontos mais fortes são: a formação humana, a espiritualidade afro e a história do negro brasileiro. Os demais temas são o favorecimento e o despertar da consciência negra, a autoestima e a valorização da negritude, a arte negra e catequese infantil, com historinhas para as crianças. Realizamos as oficinas na quadra da Igreja com a participação de pouca gente, devido à Covid-19. Visitamos os lugares históricos do Rio (Pedra do Sal, Jardim do Valongo, os terreiros de candomblé). Esse espaço de formação afro nos serve para fortalecer a nossa identidade negra pela luta contra o racismo. No mês de novembro celebramos a Semana da Consciência Negra nas comunidades São Francisco e São Benedito. Celebramos também continuamente a missa afro a cada quinto domingo, quando houver. Está acontecendo a Capoeira nas quintas-feiras. Este ano acompanhamos on-line a missa e eventos como peregrinação nacional das pastorais afros no Santuário de Nossa Senhora Aparecida. Trabalhamos em parceria com o Fórum Grita Baixada e Centro de Direitos Humanos, ambos de Nova Iguaçu. Temos atendimento jurídico, uma vez por mês. Por enquanto, o advogado está atendendo com muita restrição devido à pandemia.

Uma das consequências da Covid-19, com as quais o Coronavírus será lembrado na história, é o fato de ter revelado as desigualdades em quase todos os aspectos da vida humana. O que a pastoral afro faz em termos de propostas de trabalho, de luta além dos efeitos da pandemia entre as populações afro-brasileiras?

Em termos de propostas de trabalho diante as consequências que têm influenciado os afro-brasileiros, é nada mais que sermos solidários. A maioria das pessoas vítimas da pandemia é da população negra. Trazemos o nosso apoio solidário através as celebrações de exéquias e o consolo das famílias que perderam seus entes queridos vítimas da Covid-19. Essas famílias encontraram a consolação de Deus a partir do encontro que fizeram com os missionários da Consolata nos momentos mais difíceis. A paróquia Senhor do Bonfim promove a ação social, isso se faz por meio da iniciativa dos vicentinos para ajudar as famílias carentes do bairro Engenheiro Pedreira. Essas famílias recebem as cestas básicas, mais ou menos são 70 famílias cadastradas que recebem essa ajuda. A paróquia tem uma farmácia comunitária onde as pessoas sem condições financeiras para comprar remédios vêm solicitar a ajuda. Confirmo que esse trabalho social faz parte diretamente da pastoral afro que é também uma pastoral social.

Insistindo sobre a precarização da vida dos povos negros. Se há gente que têm sofrido em nosso continente, não obstante a pandemia são os afro-brasileiros e os povos indígenas. No Brasil, no próximo dia 20 de novembro vamos celebrar o Dia da Consciência Negra. O que você tem a dizer a respeito?

Apesar de que o nosso município não teve um número significativo de vítimas da Covid-19, a pandemia causou muito impacto na economia da população. O município tem 104.768 habitantes segundo os dados de IBGE de 2019. É um dos municípios mais carentes nas periferias da grande cidade do Rio de Janeiro. A maioria dos habitantes tem rendimento de até ¼ do salário mínimo. Aproximadamente 30.132 não têm instrução, outros têm ensino fundamental incompleto (Cf. HTTP://www.ibge.gov.br). A maioria da população não tem acesso ao Ensino Superior. Trabalha na cidade do Rio. Sai de manhã às 4h e volta no fim da tarde. Trabalha como gari, arrumadeira, vendedor ambulante, motorista, entre outros. O que posso acrescentar mais é que os Agentes de Pastoral Negros – APNs conseguiram após muita luta e perseverança, que a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, aprovasse o texto-base da Campanha da Fraternidade de 1988, objetivando estes princípios: aprofundar a história do povo negro, favorecer o despertar da consciência negra e a autoestima do povo, valorizar as raízes e valores da cultura africana e de seus descendentes, combater toda espécie de discriminação racial na família e, em todas as esferas, trabalhar por uma integração pacífica e igualitária das raças e etnias que compõe o povo brasileiro, promover oficinas sobre a história e cultura africana e dos afro-descendentes, organizar encontros de formação através de palestras, seminários e debates e promover as vocações sacerdotais e religiosas. Acredito que com participação de todos negros e brancos, podemos nos unir para construir um mundo melhor. ν

* Paulo Mzé, imc, é diretor da revista Missões.

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