Ato público contra Reforma da Previdência na BA

Diocese de Ruy Barbosa programa ato contra a Reforma da Previdência e reúne cerca de 800 pessoas.

Por Mário de Carli e Erivaldo Gomes de Almeida

Na manhã do sábado, 8 de abril de 2017, em frente à Catedral Santo Antônio, reuniram-se cerca de 800 pessoas vindas das diversas paróquias da diocese de Ruy Barbosa, BA, para um Ato Público contra a Reforma da Previdência Social proposta pelo governo Temer. Aos representantes das comunidades juntaram-se movimentos sociais, sindicatos, cooperativas, estudantes, professores, educadores, e pessoas de boa vontade. “O Povo de Deus não é somente o Povo da Igreja!”

O evento nasceu a partir do encontro do clero diocesano realizado dia 21 de março.  Entre outros assuntos tratados teve destaque principal “a atual proposta de Reforma da Previdência Social” encabeçada pelo governo Temer. Após um aprofundamento sobre o tema, surgiram e foram assumidas várias propostas: foi escrita uma carta ao povo de Deus esclarecendo os males dessa PEC 287/2016; foi encaminhado um abaixo assinado para que o povo de Deus pudesse manifestar sua indignação diante dos assaltos a seus direitos, e, insistindo que não podia faltar um Ato Público, foi elaborada o esboço de uma carta convocando o povo em geral para um Ato Público de protesto contra as medidas absurdas dessa reforma. Este Ato Público ficou marcado para o dia 8 de abril começando em frente da Catedral Santo Antônio, em Ruy Barbosa.

reformatemer1A Carta convocatória foi enviada a toda a Diocese pelo nosso bispo dom André que usou estas palavras: “Faço uma convocação concreta para o “nosso” Ato Público”: estimado povo de Deus, organizações, sindicatos, associações, igrejas, pessoas de boa vontade.  Com esperança e fé, em comunhão com todos os que estão indo às ruas, a Diocese de Ruy Barbosa vos convoca para um Ato Público contra a atual proposta de Reforma da Previdência e em defesa de Direitos garantidos que estão sendo violados”.

A organização e coordenação do evento contou com Pe. Carlos Marçal, (Reitor do Seminário Diocesano Bom Pastor), a Cáritas, a CPT e o Fórum da Cidadania. Dom André abriu o Ato dizendo que estávamos ali “animados pela Igreja, sem esquecer o povo que em suas organizações e movimentos, lutam por um mundo melhor. Unidos somos fortes, unidos queremos manifestar o que nos move e o que nós esperamos alcançar com fé”. E abençoou esse Ato de compromisso pela defesa dos direitos.

Ao longo do trajeto que saiu da Praça Santa Teresa, muitas pessoas subiram ao carro de som para manifestar a sua indignação pela proposta da Reforma da Previdência. Presidentes dos Sindicatos de várias cidades da diocese, representantes políticos, lideranças das comunidades cristãs, jovens apresentaram em poemas e versos a sua insatisfação; um poeta cantor repentista improvisou sua música.

Padre Frans (Francisco) Verhelle, trabalhando há anos na Diocese, especialmente na Pastoral dos Portadores de Direitos Especiais – PODES, “sempre ao lado dos sofredores por um mundo melhor” denunciou que “O Brasil, com esse governo atual, tornou-se o campeão mundial da exclusão social. Nunca se viu um governo no mundo fazer tal coisa: desprezar e jogar na miséria total pessoas indefesas como essas que vivem, convivem e sobrevivem, graças às ajudas beneficentes das pessoas solidárias. Agora quer acabar com as instituições filantrópicas de assistência social. É o desmonte da Previdência social e da chegada iminente da miséria para o povo dos pobres”.

Um dos pronunciamentos incisivos coube ao Padre Erivaldo Gomes de Almeida, pároco de Macajuba-Ba, que disse: “Javé é o Deus dos Pobres, do povo sofredor, que vê e ouve o clamor do seu povo escravizado e desce para libertá-los das mãos do Faraó!”

Por fim, o Bispo Dom André De Witte concluiu o Ato Público agradecendo: “Agradeço a Deus e ao povo que aqui e Brasil afora está se mobilizando e manifestando o que verdadeiramente quer. Agradeço na pessoa do Pe. Carlos Marçal à equipe toda que organizou esse evento. Agradeço de todo o coração ao clero de Ruy Barbosa, pois foi no encontro do clero que saiu essa iniciativa: “não pode faltar um Ato Público” e este Ato entra na história de uma luta que continua. Ouvimos vários apelos para que isto continue. Fizemos um abaixo assinado como ação mobilizadora que será entregue em Brasília às autoridades governamentais.  A rua é o lugar do povo se manifestar. E aqui continuamos em vigília, atentos, sob os olhares da Virgem Aparecida que nos guarde e nos envolva nessa luta. Que Deus, que é nosso Pai, e nos ama como Mãe, nos abençoe para que direitos conquistados não sejam retirados e que nós sejamos os instrumentos para Ele realizar o seu Plano de paz, de justiça e de felicidade para todo o Povo de Deus.”

 Absurdos dessa Reforma

A atual proposta de Reforma da Previdência Social traz muitos absurdos, dentre eles, pretende acabar com a filantropia, tirando o direito ao benefício de instituições beneficentes e de caridade, inviabilizando os serviços que hoje prestam aos pobres. O Deputado Federal Arthur Maia (PPS-BA), relator da proposta, tem se pronunciado categoricamente contra as desonerações fiscais em favor das instituições filantrópicas. Chegou ao ponto de apelar à difamação pública dessas instituições centenárias, imputando-lhe adjetivos como: “pilantropia”, “pouca vergonha” e “aberração” no infeliz intuito de desqualificar a imunidade tributária das entidades beneficentes e de assistência social.

Impactos graves na sociedade

Alguns dados e ilustrações para melhor compreensão da gravidade do assunto:

As entidades imunes proporcionam um retorno social da ordem de 5,92 x 1. Isto é, para cada R$ 1,00 não cobrado em tributos, R$ 5,92 são convertidos em benefício da população, na forma de serviços, empregos, infraestrutura, qualidade de vida e conhecimento. Ou seja: se o governo tirar a filantropia das instituições que prestam esses serviços, ele terá que arcar com a assistência a essas pessoas, gastando 5,92 vezes mais do que arrecada para dar o atendimento necessário. Como percebemos, essa decisão é pouco inteligente e incidirá diretamente na queda ou desqualificação do atendimento dos mais necessitados.

As isenções das Entidades Filantrópicas correspondem a apenas 3% da arrecadação total da Previdência Social, de modo que a suspensão de tal isenção não vai solucionar o problema.

Caso as Entidades Filantrópicas percam esse incentivo, centenas ou milhares de escolas, hospitais, universidades, centros sociais, centros de atendimentos a vulneráveis pertencentes a estas instituições deverão fechar as portas. Milhões de pessoas serão privadas de atendimento digno e humanitário nas unidades atendidas pelas filantrópicas e passarão para a rede pública, já incapaz de oferecer ao nosso povo o mínimo em saúde e educação.

Consequências  na sociedade

atopublico1A consequência de curto prazo será o aumento de crianças e adolescentes vivendo na rua, com muita possibilidade de futuramente assaltarem os que hoje lhe negam um tratamento digno. E então, a economia feita hoje, será insuficiente para construir prisões para abrigar os infratores produzidos pelo abandono por tal decisão. Uma pena que a maioria dos nossos políticos não consigam ver além da próxima eleição.

A isenção não significa doação ou favor, mas uma contrapartida do Estado ao serviço que lhe caberia prestar aos mais pobres.

Eliminar a isenção equivaleria, na prática, inviabilizar o serviço de 1.400 instituições na área da saúde, mais de 2.100 na área da educação e mais de 5.000 na área da assistência social. É incalculável o impacto que isso provocaria na vida de milhões de empobrecidos!

As Entidades Filantrópicas, acostumadas a fazer o mais com o menos, são fundamentais para a implementação de políticas públicas e para diminuir desigualdades sociais. Dados dos Ministérios da Saúde, Educação e Desenvolvimento Social e da Receita Federal revelam que, para cada “um Real” de isenção previdenciária, a contrapartida pelas entidades é de “5,92 Reais”, ou seja, “seis vezes mais” do que receberam em desoneração previdenciária.

Um Novo Modelo Social

O economista Eduardo Fagnani, pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e do Trabalho e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), afirmou na comissão que a Reforma da Previdência proposta pelo governo não é apenas um ajuste fiscal, e sim uma mudança do modelo social pactuado em 1988.

“Sem dúvida, a Constituição [de 1988, pós-redemocratização] é um dos grandes legados do PMDB para este país. É o marco do processo civilizatório brasileiro. O gasto social está relacionado às demandas da democracia”, afirmou. Ele citou como exemplo o cenário na Europa após a Segunda Guerra Mundial para defender o incremento dos gastos sociais em tempos de crise.

“Na Europa pós-guerra, os gastos sociais cresceram de 6%, 7% do PIB (Produto Interno Bruto, soma dos bens e riquezas produzidos em um país) para 20%. Em 2010, na crise financeira internacional, mesmo com as restrições, o gasto social cresceu em todos os países”, destacou.

Hoje, as isenções fiscais concedidas ao setor filantrópico estão em discussão devido à necessidade do Governo de aumentar a arrecadação.

Na mira dos técnicos estão isenções e reduções de alíquotas da contribuição previdenciária concedidas a diferentes setores econômicos, como os R$ 11 bilhões que deixaram de entrar no caixa do Tesouro no ano passado devido aos benefícios a entidades filantrópicas e assistenciais, especialmente na área hospitalar, mas também as organizações educacionais e religiosas.

Caso esse ponto passe na Reforma, o impacto em nível local seria gigantesco. As entidades sem fins lucrativos são mais baratas, oferecem melhor serviço e mais estrutura que a governamental. Além disso, o objetivo dessas instituições, desde que foram fundadas, é colaborar para o desenvolvimento social do país. O fim da renúncia fiscal poderia ser visto com um contrassenso e improcedente. É hora de esperança, de olhar novamente sobre o Brasil, de buscar caminhos equitativos e justos para todos. Como cristãos é nossa missão a construção do reino de Deus que passa pela acolhida aos mais pobres e necessitados. Um governo que deseja ser lembrado por todos, jamais deve se esquecer dos que clamam por vida digna.

Mario De Carli é missionário da Consolata em Nova Redenção e Ibiquera e Erivaldo Gomes de Almeida é pároco de Macajuba-BA.

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