A realidade, nada mágica, da Colômbia

Elaine Tavares

As recentes eleições parlamentares na Colômbia tiveram resultados assustadores do ponto de vista, até, da dita democracia burguesa. Dos 32 milhões de colombianos aptos a votar, 56% não compareceram às urnas, 10% votaram nulo e outros 6% não marcaram as cédulas, o que significa que os eleitos garantiram suas vagas com apenas 28% dos votos. Para quem vive na Colômbia isso não é novidade, no ano de 2002, por exemplo, só a abstenção ficou em 67%, e no anos de 2010 chegou a 59%. Uma mostra clara da completa falência do chamado "estado democrático" naquele país.

Os motivos para essa alta abstenção são muitos, mas entre os principais está o fato de que uma boa parte da população não tem acesso a esse que é um dos direitos da democracia, seja porque tem medo, seja porque vive a mudar de residência em função dos constantes desalojamentos provocados pela guerra civil, pelos paramilitares e pelos narcotraficantes.

Um outro elemento é a completa descrença com relação a institucionalidade. Vivendo um quadro de violência de estado desde há décadas, a população não acredita no chamado processo democrático, até porque não tem nada de democrático. São ostensivos os casos de compra de votos, fraudes e uso da violência para obrigar as pessoas a votar em determinados candidatos ligados ao poder dominante. Daí que votar nas eleições parece ter perdido todo o significado. Passe o passe, sempre vencem os mesmos que controlam o país desde o trágico "bogotaço".

Um dos exemplos mais gritantes foi a eleição "retumbante" do ex-presidente Álvaro Uribe, reconhecidamente ligado ao mundo do narcotráfico e responsável - enquanto foi presidente - pelo aprofundamento do estado de terror na Colômbia. Seu partido recém criado, o Movimento Centro Democrático, que tem como lema "mão forte, coração grande", obteve mais de dois milhões de votos (14,29%) que, além de elegê-lo para o senado, arrastou mais alguns de seus colegas, garantindo assim a possibilidade de ser a segunda força política na casa legislativa.

Assim, ele rivaliza mano-a-mano com seu agora arqui-inimigo, o atual presidente Juan Manuel Santos, cujo partido, Partido da União Nacional, obteve 15,58% dos votos válidos - sendo a primeira força.
Outro dado interessante foi a votação dos grupos de esquerda, completamente inexpressiva, o Partido Aliança Verde e o Polo Democrático, não passam dos 7% juntos, cada um fazendo 3,94% e 3,78%, respectivamente. Isso não coaduna com a visibilidade e o trabalho desses movimentos, uma vez que estão bastante atuantes nas discussões do processo de paz, o que faz aumentar ainda mais as denúncias de fraude.

Nas redes sociais, são muitos os colombianos que buscaram os dados da Registraduría Nacional - o equivalente ao nosso TRE - para saber se o seu voto tinha sido computado e os votos não estavam lá. Outra olhada no mapa da Colômbia mostra que a maior quantidade de votos para o partido de Uribe está concentrada nas zonas que são dominadas pelos grupos paramilitares. Por outro lado, na capital Bogotá, que de certa forma está mais protegida das influências do terror e da fraude, a esquerda levou a maior parte dos votos.

Acompanhando as redes sociais e a ação de figuras como Uribe, fica bastante claro que o terror ainda é o melhor instrumento que a classe dominante usa para se manter no poder. Durante a campanha, Uribe postou no seu twitter e no facebook dezenas de imagens chocantes de policiais e militares colombianos mortos, supostamente pela guerrilha, argumentando que só sua "mão firme" traria paz para a Colômbia, opondo-se assim às iniciativas de paz que acontecem agora no país.

Também disparou sua metralhadora de palavras contra o que chama de "castro-chavismo", dizendo que, com ele, isso não iria vingar na Colômbia. É bem possível que sua ação no senado seja a de colocar obstáculos ao processo de paz, impedindo os avanços constitucionais que estão em discussão. É certo que como senador ele não vai contar com a força que tinha como presidente, mas, com certeza será a voz mais forte do terror no legislativo, liderando seus 19 colegas de partido - que nada mais é do que uma dissidência dentro da classe dominante. Ou seja, em muitas coisas, tanto o seu partido como os outros três - de linha conservadora - que têm a maioria, vão concordar. A divergência maior, que fez, inclusive, Uribe se desentender com Santos, é o diálogo com as FARCs, coisa que Uribe não quer de jeito nenhum , por motivos óbvios. A guerra é fonte de enriquecimento para ele e seus parceiros.
Num universo de 102 senadores, a esquerda ficou com apenas 10 cadeiras. Seguirá com seu papel de denúncia, sem muita influência real nas decisões.

Agora, terminada a eleição legislativa, as forças já começam a campanha para a disputa presidencial, que acontece em maio desse ano. O presidente Juan Manuel Santos, que já tem como aliados os partidos Liberal e o Câmbio Radical, anunciou que vai buscar a reeleição e certamente buscará um acordo com seus parceiros de classe. É comum as divergências ficarem em suspenso nesses momentos em que o principal é garantir o seguimento do controle do país. Ainda assim, o Partido Conservador sairá com candidatura própria, o que nada inviabiliza alianças para o segundo turno. Igualmente haverá candidato próprio no partido de Uribe, que tem se mostrado implacável com o velho amigo, hoje presidente e inimigo. É Óscar Zuluaga, considerado um marionete na mão do agora senador.

O principal partido de oposição, o Polo Democrático, tem vivido algumas turbulências, com movimentos dissidentes dentro dele, mas já tem uma candidatura de fôlego, a economista Clara López Obregón, de larga militância de luta e administrativa, tendo sido prefeita de Bogotá, com atuação bastante elogiada. A União Patriótica, outro partido de esquerda, definiu a comunista Aída Abella como candidata à presidência. "Acusada" pelos paramilitares de ter ligações com as FARCs, ela tem sido constantemente ameaçada de morte. Não será uma campanha fácil na Colômbia, e as eleições legislativas já mostraram que a fraude e a violência seguem sendo o cardápio usual. Assim, nenhuma novidade será se tudo permanecer como está.

 

 

Fonte: Revista Missões

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