O fim do trabalho

Alfredo J. Gonçalves *

Trabalhadores no cenário do "desenvolvimentismo" brasileiro.

Comecemos com uma declaração bombástica: o trabalho, em sua expressão clássica, está agonizando. Já em meados do século XIX, mais precisamente em 1848, no Manifesto Comunista, Marx e Engels profetizavam: "Tudo que é sólido se desmancha no ar". Rompem-se os contratos sociais de fôlego largo. Instala-se a noção de experimento em uma ampla gama de relações, incluindo as de ordem trabalhista.
Há tempo, Zygmunt Baumann vem trabalhando com a noção de liquidez. Vários de seus estudos levam como subtítulo o adjetivo líquido. Na modernidade tardia ou pós-modernidade, as relações permanentes tendem a ser substituídas por experimentos de curta duração, por vezes superficiais e descartáveis. O que vale para outras instituições, vale também para o mundo do trabalho. O "fim do trabalho" é tema amplamente debatido. Trabalho entendido aqui como um contrato sólido entre o trabalhador e a empresa. Contrato estável, às vezes passado de pai para filho. Prevalecem hoje outras relações trabalhistas, muitas vezes execradas pela luta sindical, tais como trabalho escravo, infantil, domiciliar, temporário... Uma contradição do sistema capitalista: coexistem, lado a lado, tecnologias de ponta e formas de trabalho arcaicas.
O trabalho sólido, com longas perspectivas de futuro, dá lugar a uma série de "bicos" incertos e com frequência, mal remunerados. O que, além de comprometer os ganhos individuais do trabalhador, compromete igualmente sua força coletiva. O terreno é volátil, escorregadio, inseguro.

Brasil: país emergente
Tudo isso se acelera com o cenário atual do neodesenvolvimentismo da economia brasileira, integrada ao grupo BRICS dos chamados países emergentes: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. No micro e no macro, a solidez dos contratos e relações tende a derreter-se. As respostas imediatas para problemas imediatos se sobrepõem aos projetos planejados e de longo alcance.
Nesta "sociedade do espetáculo", segundo Guy Debord, vivemos num imenso teatro: somos chamados a desempenhar funções. Se antes valia o ter mais do que o ser, agora o ter deu lugar ao fazer, comprar, aparentar. Está em jogo a performance, a capacidade de produzir e consumir. Dessa capacidade, se mede o valor do ser humano. O trabalhador é duplamente explorado: no contrato de trabalho e na qualidade de consumidor. O cidadão torna-se cliente, usuário!

Os imigrantes
O adjetivo emergente aparece como uma grande panacéia para todos os males. Embora a economia aparente sinais de maior robustez e pareça menos exposta às turbulências externas, o Brasil carrega cicatrizes do subdesenvolvimento. País emergente, sem dúvida, mas para quem? País de novos milionários, mas quem são eles? Uma grande parte da população experimenta o abandono e a precariedade da ação do Estado, seja em termos federais, estaduais ou municipais.
Há perguntas que não querem calar: por que faltam recursos para hospitais, escolas e melhorias sociais, por exemplo, enquanto o Estado socorre com presteza as obras da Copa das Confederações (2013), Copa do Mundo (2014) e dos Jogos Olímpicos (2016)? Nada contra o esporte sadio, que inclusive costuma gerar emprego e oportunidades. Mas, por que uma política econômica do espetáculo e do evento, em lugar de uma preocupação com o processo sério de melhoria das condições socioeconômicas?

Alfredo J. Gonçalves, CS, é assessor das pastorais sociais e superior provincial dos missionários carlistas. Publicado na edição Nº 04 - Maio 2012 - Revista Missões. (Clique aqui e peça a sua)

Fonte: Revista Missões

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