Paulo, Apóstolo das nações e ??comunicador do Crucificado??

Michael Mutinda*

Paulo é o homem das encruzilhadas. Viveu e operou em diferentes mundos, línguas e culturas. Desenvolveu uma presença, mais esporádica ou mais continuada, em centros urbanos importantes e disseminados como Antioquia na Síria, Éfeso na Ásia Menor, Filípos, Corinto e Atenas na Grécia, culminando a sua obra no coração do império. Um verdadeiro corre-mundos do Tempo Antigo.

Paulo sempre ocupou uma posição especialmente cômoda: a critica, não menos que a tradição, acredita saber quem foi, onde nasceu, qual o seu caráter, quais foram as etapas fundamentais de sua vida e as datas correspondentes, as cartas que escreveu, quem foram os seus destinatários e inclusive qual o conteúdo e a intenção dessas cartas. Ao tratarmos acerca da biografia de Paulo, temos de considerar as inúmeras controvérsias existentes entre os variados estudiosos que aprofundam o tema. Contudo, não obstante à pluralidade de hipóteses sobre a vida de Paulo, é possível fazer algumas afirmações seguras sobre este polêmico Apóstolo das nações e ‘Comunicador do Crucificado'.

Comissionamento e Morte
Lucas é extenso em detalhes ao descrever a perseguição da Igreja por Paulo. Menciona-o primeiro como um jovem (At 7,58) que assistiu com satisfação à horrível execução de Estêvão (At 8,1). Sua aparição seguinte é como o grande perseguidor que penetra nas casas dos cristãos e lança os ocupantes na prisão (At 8,3). Em Gl 1,13 destaca "perseguia sobremaneira e devastava a Igreja de Deus". Nesses escritos, a questão da perseguição é colocada como pano de fundo para sua atividade de Apóstolo. Mas, Paulo não o faz como auto-condenação, para alimentar um sentimento de culpa, e sim para destacar a gratuidade de ação de Deus ao lhe conceder o ministério de Apóstolo. Sobre a sua mudança de vida, Paulo não fala em conversão, em contraste com os três relatos pormenorizados que Lucas faz da conversão dele. (At. 9,1-19; 22,4-16; 26,9-18.), mas se expressa de forma enigmática em seus escritos para mostrar o que aconteceu em seu encontro com Jesus.

"Podemos afirmar que Paulo interpreta o acontecimento de Damasco como um chamado de Deus, uma vocação a uma missão que o assemelha aos profetas do Antigo Testamento. Como eles, foi ele agraciado com uma visão; uma missão lhe foi imposta do mesmo modo que a eles; como eles também, ele é obrigado a corresponder ao chamamento; sua vontade humana é investida pela graça ao ponto de Deus mesmo realizar a obra que lhe foi confiada." (CERFAUX, Lucien. O Cristão na Teologia de Paulo. São Paulo: Paulus, 2003. p. 91)

A experiência que dá novo rumo à existência de Paulo é recordada em diversas passagens de suas cartas (I Cor 7,25) em que ele não descreve pormenores e prevalece o silêncio. Paulo não é um pecador que retorna ao caminho do bem. Por isso, uma forma de se referir a esse acontecimento é falar de uma descoberta de Cristo com os olhos da fé, o filho de Deus, único mediador da salvação. Paulo diz que viu "Jesus" e por isso é apóstolo (I Cor 9,1s). Quer dizer que somente uma experiência lhe valeu tanto como valeram aos demais apóstolos, os irmãos do Senhor e até mesmo a Pedro (v.5). A este contato direto corresponde a ideia de que é Apóstolo ‘não da parte de homem e nem por meio de algum homem' (Gl 1,1) e que o Evangelho ‘não o recebeu nem o aprendeu de homem nenhum' (v.12). Também é própria de uma comunicação direta, por seu caráter surpreendente, a ideia de que Deus lhe revela ‘seu Filho' e lhe pedia que o anunciasse entre os gentios.

Ser Apóstolo de Jesus Cristo é sinal primordial da intervenção divina na vida de Paulo. Quase todas as cartas do "corpo paulino" trazem no início a auto-apresentação do Apóstolo. "Paulo, Apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de Deus" (Rm 1,1) ou com pequena variação de palavras ou nomes de companheiros dele como remetentes junto com ele.

Existem diversas opiniões sobre o que aconteceu com Paulo, desde a sua chegada a Roma até a sua morte como mártir naquela cidade . A última viagem de Paulo se inicia com a decisão de ir a Jerusalém (At. 21,17) para levar algumas ofertas à comunidade. Após ser preso, Paulo é deportado para Roma onde, segundo a tradição, algumas semanas mais tarde, sofreu a pena reservada a um cidadão romano - a decaptação pela espada.

A missão e o anúncio
A consciência da missão faz de Paulo um itinerante. Ele realiza verdadeiros empreendimentos em suas viagens, enfrentando perigos para pregar o Evangelho - anunciar o Crucificado. Os Atos dos Apóstolos descrevem três grandes viagens (At 13-14; 15,36-18; 18,18-20,38), mas ele mesmo fala de muitas: "Fiz muitas viagens. Sofri perigos nos rios, perigos por parte dos ladrões, perigos na cidade, perigos no deserto, perigos no mar. Três vezes naufraguei. Passei um dia e uma noite em alto-mar". (II Cor 11,25-26).

O núcleo da mensagem de Paulo é o querigma cristão, o anúncio da morte e da ressurreição de Jesus. O evangelho anunciado por Paulo é muito mais que uma comunicação verbal de doutrinas ou normas, e se fundamenta no anúncio da morte escandalosa de Jesus na cruz e na sua ressurreição como manifestação do poder de Deus.

*Michael Mutinda, é missionário da Consolata no ano de serviço em Salvador, BA.

 

Fonte: Revista Missões

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