Adeus xenofobia

Egon Heck *

Interior do Mato Grosso do Sul. Um belo espetáculo de memória e história da cultura tchecoeslovaca. O país Tcheco é apresentado como o coração da Europa, por sua centralidade no velho continente. Dentre suas contribuições com a humanidade destacam-se celebridades como Freud e se faz menção aos pais de Juscelino Kubitscheck, originários da atual república Tcheca. Lindas danças folclóricas são apresentadas, sendo uma conhecida pelo seu sabor : Bohemia.

Até aí tudo bem. Afinal de contas nos conforta saber que o receptivo Brasil, acolheu de braços abertos, gente de todo o mundo. Não faz mal a ninguém saber que até no nome de cidades do Mato Grosso do Sul se usou o nome de emigrantes tchecos ( de 1948) para dar nomes tcheco-guarani a cidades como Bata-Y-Porã (Bataiporã) e Bata-Guasu (Bataguasu). Os descendentes do migrante Bata fazem bela homenagem, na Câmara municipal de Nova Andradina. Até aí tudo normal.

Na apresentação sobre cada um dos países (Theca e Slovaquia) algumas afirmações e estatísticas, chamaram atenção. Ao se referir à presença de população cigana, no país theco, afirma que infelizmente em seu país ainda existe bastante xenofobia com relação a essa população. E arremata: isso felizmente não acontece no Brasil. Como atento ouvinte tive a tentação de romper o silêncio e dizer em alto e bom tom "em termos". Talvez a digníssima palestrante não tivesse tido a oportunidade de sentir a alma sulmatogrosense em toda sua extensão, para se dar conta de que o nome guarani das cidades seja uma homenagem colonial carregada de preconceitos, racismo e xenofobia.

Prova disso é que nesta mesma data setores políticos e do agronegócio vociferavam contra a assinatura da portaria declaratória da Terra Indígena Taquara, onde foi assassinado o líder Kaiowá Guarani, Marcos Verón, no início de 2003. A negação da terra aos Kaiowá Guarani, é a prova maior de negação da vida desse povo, de xenofobia encoberta por belos discursos de "progresso e democracia".

Durante três dias a vice-embaixatriz da República Tcheca, Jana Chaloutkova, esteve conhecendo um pouco da realidade do Mato Grosso do Sul. Ficou impressionada e sensibilizada pela dura realidade vista e sentida. Se comprometeu a refletir sobre essa realidade com colegas de outras embaixadas e levar essa realidade para várias instâncias como a união européia, ONU e outros espaços por onde passam os debates sobre direitos humanos e economia global.

Dia da copa do mundo
Um dos filhos de Damiana entre apressada no barraco, carregando uma preciosidade, um velho aparelho de TV, 14 polegadas, preto e branco, marcada pelo barro vermelho da região. No acampamento indígena Apyka'i, próximo a Dourados, tudo está pronto para o início da copa do mundo. Se espera que a telinha não se negue a mostrar o espetáculo. Que a bateria se digne a fornecer energia nos próximos dias.

Driblar a fome, colocar a bola na marca do pênalti, e quem sabe marcar um gol de esperança, será a faina nas aldeias guarani kaiowá, nos próximos dias. Quem sabe possamos fazer algum gol contra a xenofobia e avançar no reconhecimento e demarcação das terras indígenas, em especial dos Guarani.

* Egon Heck, Povo Guarani Grande Povo.

Fonte: Cimi MS

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