Defesa dos ameaçados

Egon Heck *

"Não temos mais pra onde correr: os fazendeiros e jagunços nos ameaçam, a Funai se diz impotente(reestruturação/omissão), a justiça nos condena, resta pra gente a prisão ou morte. Mas a luta pelos nossos direitos não abandonamos, da nossa terra tradicional não desistiremos..." nestes termos foram feitos vários depoimentos na recente Aty Guasu, bem como nas visitas da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, do secretário Geral da CNBB, presidência e Conselho Nacional do Cimi.

Um telefonema da aldeia de Kurusu Ambá mostra o sobressalto da comunidade "Tem um helicóptero sobrevoando a gente. Será o despejo?", perguntam angustiados. "Não", respondi. "helicóptero amigo. É a Comissão de defesa dos defensores de direitos humanos, de Brasília, que está chegando" Alívio. Dias antes viaturas da polícia federal chegaram ao mesmo local pedindo que os índios deixassem a terra, pois havia uma ordem de reintegração de posse e cabia a eles executá-la. Retornaram no outro dia informando que a retirada não seria imediata, mas que voltariam ali no dia 27 de abril e não queriam mais encontrar nenhum índio ali. Suspiro para quem estava sentindo a eminência de mais uma violência.

Os Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul tem consciência de que não estão só. Tem importantes aliados e defensores como o Ministério Público Federal, Secretaria Especial de Direitos Humanos, e várias entidades nacionais e internacionais de defesa dos povos indígenas e dos direitos humanos. Porém o recente flagelo a que foram submetidos ao buscarem seu espaço tradicional para sobreviver, os deixa os mais de uma centena de indígena de Kurusu Ambá, sobressaltados. Desde janeiro de 2007 já tiveram quatro membros assassinados, quatro lideranças presas e condenadas a 17 anos e meio de prisão, vários feridos a bala, uma fome permanente que já vitimou uma criança e os deixa em total situação de dependência de cestas básicas e ações assistencialistas para sobreviverem.

Em Dourados a Comissão ouviu algumas das lideranças que sofrem constantes ameaças. Depois seguiram para a visita a comunidades Kaiowá Guarani. Puderam sentir um pouco do clima anti indígena, ameaças e violências a que estão submetidos nos confinamentos, acampamentos e retomados dos tekohá. O pouco tempo não permitiu ir a algumas regiões, como Paranhos, onde foram assassinados os professores Jenivaldo e Rolindo, onde continuam as ameaças a lideranças e comunidades indígenas.

A Comissão do Programa Nacional aos Defensores dos Direitos Humanos esteve no cone sul do Mato Grosso do Sul, região dos Guarani Kaiowá nos dias 12 e 13 de abril. Teve uma missão muito importante neste momento em que está em curso a conclusão do relatório de identificação das terras tradicionais desse povo. "Foi importante eles ouvirem o que sofrem os parentes", comentou uma das lideranças que acompanhou a comissão. Só reclamou que o colete a prova de bala que usou, como os demais, pesando uns dez quilos, lhe machucou um pouco o ombro.

Dia do índio - nada a comemorar
Na véspera de mais um "dia do índio" é de cortar a alma ao passar pelos acampamentos e ouvir a solicitação "dá pra ver uma ajuda para fazer pelo menos um puchero (osso com nesgas de carne e mandioca) pro dia 19?"

O que mais gostariam de estar comemorando, a publicação do relatório de identificação de suas terras, infelizmente não aconteceu. Apesar de tudo os Guarani comemoram a resistência, a vida e esperança expressa nas inúmeras crianças que nascem cada ano (em média mais de cinco filhos por família), os momentos de encontros celebrativos e de decisões das políticas para seu povo, que são as Aty Guasu, Jeroki Guasu (ênfase nos rituais, dimensão celebrativa de sua espiritualidade), nos encontros amplos do povo Guarani, como os encontros continentais e o recente encontro em Añetete, no Paraná) e as Aty, que são os encontros menores das comunidades ou regiões.

A vida, a luta e a esperança continuam para além de todas as violências e ameaças. A alegria de viver brota da profundidade da raiz e desabrocha em constantes alegrias e avanços na luta por seus direitos.

* Egon Heck, Camampanha/movimento Povo Guarani Grande Povo.

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Fonte: Cimi MS

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