Um mapa vivo, um povo combativo

Egon Dionísio Heck *

"Nunca mais uma América do Sul sem os Guarani. Nunca mais um Paraguai sem os Guarani" (Georg Grunberg- Assuncion, 17/02/10)

Aos poucos umas duas dezenas de pessoas, alguns já de cabelos brancos e andar alquebrado, outros mais jovens e entusiastas, vão chegando à Casa das Nações Unidas, em Assuncion, no Paraguai. No final do dia 17 de fevereiro, agora na sede da Associação Indigenista Paraguai, nova movimentação, de umas 70 pessoas, de todas as idades, com destaque para uma dezena de velhos batalhadores da causa indígena, desde a década de setenta, no Paraguai. O encontro foi na sala Miguel Chase Sardi. Emblemático. A resistência indígena e indigenista dos tempos da ditadura, agora estava reunida em torno de uma nova ferramenta de luta pelos direitos dos Povos Guarani: o Mapa Guarani Retã. Os tempos são outros, porém os desafios e enfrentamentos continuam, agora com outros atores e interesses articulados mundialmente.

Depois de três séculos

O Pe. Bartomeu Meliá ressaltou a importância do mapa que está sendo lançado nos três países, como a única experiência de fazer uma mapa abrangente do povo Guarani, depois dos trabalhos neste sentido, feitos pelos jesuítas nos séculos dezesseis e dezessete. Como entusiasmado colaborador do mapa e em especial do texto dos cadernos, Meliá, não escondeu sua satisfação ao ver uma obra tão expressiva, construída coletivamente, por inúmeros atores, tão diferentes, desde as aldeias até as universidades e entidades solidárias com os povos Guarani: "Depois da criação dos Estados Nacionais, no século 19 , quando se construiu uma espécie de "muro de Berlim", para os Guarani, esta é a primeira iniciativa de reconstruir a territorialidade Guarani, além das fronteiras nacionais.

O primeiro mapa, localizando em torno de quinhentas comunidades, será agora enriquecido com as informações de outras tantas comunidades, desde as que hoje estão na diáspora no litoral brasileiro, até as numerosas comunidades Guarani na Bolívia , no chaco paraguaio e norte da Argentina.

Para Grunberg, os territórios Guarani são "espaços de vida permanente", que tem não só ser reconhecidos, como assegurados para o bem de toda a América do Sul. Ao constatar o forte agressão e violência a que estão submetidas as comunidades Guarani hoje, ressaltou que "o transfundo do mapa, que são imagens de satélite, demonstram de uma forma sincrônica gente e meio ambiente para se atender a enorme pressão que sofrem os povos Guarani atualmente pela avalanche de uma economia que arrasa com a agente indígena e campesina e como a natureza, como se vê, principalmente no sul do Mato Grosso do Sul e na franja brasileira aqui no Paraguai".

Ampliar o sonho

A partir da avaliação do processo coletivo de elaboração e distribuição do mapa Guarani Retã, e atendendo solicitações de inúmeras lideranças e comunidades Guarani, o grupo se propôs ampliar o sonho, construindo uma rede de colaboradores ainda maior para elaborar o Mapa Continental Guarani, ou conforme sugestão dos Guarani da Bolívia o "Ñane Retã Guasu". Será um desafio instigante, reunir para um trabalho coletivo de solidariedade um grande número de pessoas de diversos países, com diferentes pensamentos. Serão em torno de 1.000 comunidades Guarani, desde o Uruguai até o Espírito Santo, no Brasil, que estarão localizadas neste novo mapa.

Na avaliação o grupo, integrado pelos mais renomados conhecedores do povo Guarani e representantes desse povo, a experiência de construção coletiva do mapa e na sua maior parte de trabalho voluntário, demonstrou que é possível ir construindo uma ampla rede de solidariedade e aliança com os povos Guarani, superando a estreiteza de interesses e relações que mais isolam e geram dependência, do que libertam e dão autonomia a esses povos.

Para a coordenadora de Conapi (Coordenação Nacional de Pastoral Indígena), Raquel Peralta, "cresceu muito a esperança dos Guarani, de seguir lutando para manter seu território. E mais, sonham em recuperar todo seu território. Creio que isso é crucial para os Guarani e também para nós que somos seus aliados. Isso é fundamental para eles. E para nós que teremos que crescer muito nas consciência, respeitar e aceitar que existe essa grande nação Guarani. O mapa revela a existência de centenas de comunidades Guarani. Neste momento tanto no Brasil como no Paraguai temos ordens judiciais de despejo...Alegra-me muito vê-los crescer em seu espírito de guerreiros, de conservar suas terras e suas culturas e contribuir para construção de políticas públicas neste país".

Assuncion, 18 de fevereiro de 2010
Campanha Povo Guarani Grande Povo.

* Assessor do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) Mato Grosso do Sul

 

Deixe uma resposta

dezesseis − um =