Falam os bispos

Egon Heck *

"A relutância em buscar políticas públicas que sanem, de uma vez por todas, o clima de desespero e de ódio entre produtores rurais e índios, faz com que cresça, a cada ano que passa, o número de vítimas, outorgando ao nosso Estado o triste primado de mortes de pessoas indefesas, que lutam para sobreviver em meio ao descaso e à perseguição que as cercam de todos os lados - mortes e assassinatos que normalmente atingem os indígenas, não os donos de fazendas. E já que no Brasil nada se consegue senão com pressão, quando os índios se atrevem a buscar seus direitos, são tratados e eliminados como animais por milícias e seguranças a serviço do agronegócio, ou acabam apodrecendo anos a fio em nossos presídios, já que são cada vez mais raros os advogados que ousam tomar a sua defesa".(Nota da CNBB Regional Centro Oeste 1- Mato Grosso do Sul)

Sábado especial. Não apenas as flores ostentam mais beleza, os pássaros cantam com maior alegria, e o sol anuncia um dia especial, Os povos indígenas no continente celebram com carinho, na diversidade de centenas de povos e culturas, N. Senhora de Guadalupe, intensificando as lutas pelos seus direitos e a afirmação de suas identidades, na pluralidade de um continente de centenas de vozes, línguas, tons e cores.

No Mato Grosso do Sul, os povos indígenas tem um motivo há mais para celebrar, em meio a grande sofrimento. A declaração dos sete bispos do regional Oeste 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil vem trazer uma postura clara e incisiva, bíblica e profética, com relação à violência decorrente da não resolução de uma situação de reconhecimento constitucional das terras indígenas. " Trata-se de uma situação insustentável e iníqua, fruto de uma sociedade de consumo que privilegia o lucro, e cuja solução, adiada indefinidamente, nada faz senão aumentar a angústia e a revolta de todos, colocando em margens opostas cidadãos de uma nação que proclama a igualdade de direitos e de deveres de todos".(Idem, nota da CNBB Oeste 1)

Vozes que se somam
A voz tremula, entrecortada de lágrimas, dos pais de Genivaldo e Rolindo, no dia mundial dos Direitos Humanos, na aldeia de Tey Ikue, pedindo justiça e informações sobre um dos corpos ainda não localizado, dá a dimensão do drama a que os Kaiowá Guarani estão submetidos.

Mas as vozes em termos do país e do mundo vão se somando, na exigência de solução urgente e definitiva, para superação das causas do que o deputado Pedro Kemp, nesse dia 11, tem qualificado como "genocídio silencioso". No vigésimo quarto encontro regional do Movimento dos Sem Terra, que está se realizado em Nova Floresta,a questão indígena teve um importante espaço, na analise da conjuntura e situação fundiária no Mato Grosso do Sul e do Brasil. João Pedro Stedile foi contundente ao afirmar que sem a solução da demarcação das terras indígenas, a reforma agrária não terá perspectiva de êxito neste estado. Após exposição e debate sobre a realidade indígena no Estado, a plenária decidiu por uma moção de apoio aos povos indígenas e repudio à violência a que estão sendo submetidos. Também foi aprovado que o nome deste Encontro Regional seria Genivaldo e Rolindo Vera, em homenagem aos dois professores Guarani Kaiowá recentemente assassinados pelos fazendeiros e seus pistoleiros.

Neste dia 12, dia de Nossa Senhora de Guadalupe , padroeira dos povos indígenas, mais uma voz firme e forte se une no clamor pelo fim da violência e solução urgente das questões das terras Kaiowá Guarani. A declaração dos bispos do regional Oeste 1 da CNBB, vem somar de maneira importante aos clamores recentes do movimento indígena, dos professores indígenas Kaiowá Guarani, da Anistia Internacional, do Comitê Nacional do PT, co Conselho Indigenista Missionário e de dezenas de organizações e entidades pelo Brasil e mundo afora.

Ações urgentes e inadiáveis
Enquanto isso, um tanto temerosos, acompanhados pela polícia federal, alguns antropólogos e membros dos Grupos de Trabalho de identificação das terras Kaiowá Guarani, vão andando pelas aldeias e acampamentos indígenas para complementar seu trabalho. Esse trabalho, lamentavelmente postergado há décadas, e combatido ininterruptamente por interesses políticos e econômicos regionais, já deveria ter sido concluído, conforme o Termo de Ajustamento de Conduta de 12/11/2007, até o dia 30 de junho deste ano. Os Kaiowá Guarani esperam que, finalmente, esse trabalho possa ser concluído o mais brevemente possível.

Enquanto isso a fome e desassistência continuam rondando as aldeias e acampamentos indígenas. Infelizmente num momento tão crucial, quando o órgão oficial deveria dar à região as melhores condições em termos de pessoal e recursos, para garantir um mínimo de dignidade e eficácia às suas ações, o que se vê é uma quase total paralisia do órgão, aumentando ainda mais a aflição dos indígenas.

Nos unimos à importante voz dos bispos e demais vozes para a urgente solução da identificação, demarcação e respeito às terras indígenas "De nossa parte, o que não podemos deixar de questionar é se o Brasil, que dispõe de verbas para obras de envergadura em todo o território nacional, não tem também recursos para realizar, de uma vez por todas, as justas expectativas de uma população cada vez mais vulnerável e explorada em sua dignidade."

* Egon Heck, Campanha Povo Guarani Grande Povo.

 

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